JUDT, TONY


TONY JUDT

Nasceu em Londres, em 1948. Formou-se pelo King's College, em Cambridge, e pela École Normale Supérieure, em Paris, e já lecionou em Cambridge, Oxford, Berkeley e na Universidade de Nova York, onde fundou, em 1995, o Remarque Institute, que se dedica ao estudo da Europa. Judt é atualmente professor titular de Estudos Europeus, ocupando cátedra instituída em homenagem a Ercih Maria Remarque, veterano da Primeira Guerra Mundial e autor do romance Nada de novo no front. Autor e organizador de onze livros, Judt é articulista freqüente em vários periódicos, como New York Review of Books, Times Literary Supplement, The New Republic e The New York Times
LIVRO SUGERIDO - EDITORA OBJETIVA

PÓS GUERRA - UMA HISTÓRIA DA EUROPA DESDE 1945 (L!)



A Europa de um historiador militante

(Francisco Carlos Teixeira da Silva)

Entramos diretamente na oficina de história de Judt, muito pessoal, e aos poucos somos levados para o interior de debates centrais sobre a história contemporânea, a política internacional e as formas de sociabilidade modernas. Tudo isso com a assunção de importantes teses de autores centrais do século XX, como Eric Hobsbawm, Richard Sennet ou A.J.P. Taylor. A nova Guerra dos Trinta Anos do século XX, o fim das utopias, a aceleração do tempo — breve ou longo no século XX — serão tratados como colunas centrais do texto, para além de um debate apenas teórico.

O Estado-mercado, de Phillip Bobbit merece, tal como a “nova direita” dos anos 80 — com o mito do Estado-mínimo e o mercado auto-regulável —, um cuidadoso trabalho de refutação. Este é, sem dúvida, o principal dos vários méritos do livro de Judt: a coragem de encarar verdades estabelecidas, buscar suas origens políticas e sociais e, por fim, a denúncia do trabalho dos intelectuais em erigi-las em mitos incapacitantes. Judt não se deteve, contudo, diante daquilo que denomina de “self-imposed moral amnésia” da intelectualidade européia, primeiro face ao nazismo, à colaboração e à recorrente justificativa de desconhecimento do fenômeno concentracionário e da limpeza étnica dos judeus na Europa culta. Ele vai além e explica o silêncio perante o stalinismo, durante décadas, como prova da própria decadência da Europa e dos seus intelectuais.

Numa obra anterior, “Passado imperfeito — Um olhar crítico sobre a intelectualidade francesa” Judt é severo com o uso de fontes irreprocháveis — sobre o silêncio de intelectuais como Sartre, Foucault ou Derrida sobre os crimes dos impérios coloniais, incluindo aí a França na Argélia, Madagascar e Vietnã e os soviéticos nas suas áreas de dominação. Mesmo em "Pós-Guerra", as teses centrais de Judt são demolidoras dos grandes mitos. A idéia da Europa vítima do fascismos, da unidade de todos na Resistência — incluindo aí a aceitação gaulista da imperiosidade política do esquecimento — são denunciadas como fraqueza e hipocrisia.

Em seu conjunto, cinco grandes teses atravessam as quase 900 páginas do livro: a redução da dimensão política e intelectual da Europa depois de 1945, acelerada pela perda dos impérios coloniais; a fragilização do que autor chama de “narrativas mestras” da História, incluindo o liberalismo exuberante e o marxismo; o surgimento de um “modelo europeu”, marcado pela superação — não unânime — do Estado-Nação e a imposição de formas cooperativistas em relações internacionais; o fracasso da americanização da Europa e a ilusão das elites locais, incluindo aquelas formadas a partir do fim do socialismo, numa sociedade marcada pela autonomia do mercado. Por fim, mas de forma totalizante para as demais teses defendidas, Judt defende a exaustão do processo político que impôs, depois de 1945, o silêncio e a amnésia histórica como forma de os europeus lidarem com o passado.

Evidentemente, o conjunto da obra de Judt, bem como seus artigos no “New York Review of Books”, possui esta marca típica: erudição e inconformismo. O relativo desconhecimento da obra de Judt no Brasil deve-se, em grande parte, ao fato de que o autor sempre desagradou a elite dos historiadores franceses, duramente atingidos pela sua crítica. Formado em Cambridge, Inglaterra, como especialista em história da França contemporânea, Judt (professor na New York University) mostrouse severo com a elite intelectual européia, sempre disposta a transferir a responsabilidade para o outro absoluto: o nazismo. As origens, a colaboração e, depois, a amnésia moral frente ao sofrimento alheio seriam marcas da intelectualidade européia, e francesa em especial. Somente depois de 1991 a adesão, por exemplo, dos franceses ao Regime de Vichy e sua participação no Holocausto — denunciada pelo historiador François Bédarida — puderam vir à luz do dia, rompendo com o silêncio gaulista e comunista.

Da mesma forma, as críticas deste judeu culto e irrequieto, originário de uma família de rabinos da Lituânia, ao Estado de Israel — chamado por ele de “etno-Estado” — valeram uma forte campanha de descrédito em 2006, com o cancelamento de palestras e conferências em virtude de pressões da Liga Americana Antidifamação. Para Judt, o “declínio moral de Israel” pode vir a ser uma ameaça à memória do próprio Holocausto, trazendo novo fôlego para o ressurgência dos fascismos e para a praga moral do negacionismo (a negação do Holocausto).

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