CARPENTIER, ALEJO


ALEJO CARPENTIER

Romancista, contista, poeta e musicólogo, Alejo Carpentier nasceu em Havana em 1904. Filho de arquiteto francês, passou a infância na Europa. Em 1921, de volta a Havana, inicia estudos de Arquitetura, os quais abandona para dedicar-se ao jornalismo e à música. Em 1924, é nomeado chefe de redação da revista cubana Carteles, e começa a trabalhar como organizador dos primeiros concertos de "música nova".É preso em 1927 por participar de um protesto contra a ditadura de Machado. Abandona Cuba secretamente e muda-se para Paris, onde permanece até 1939. Durante sua estada em Paris, trabalha como crítico musical e como compositor; entra em contato com o grupo surrealista de A. Breton; e colabora com a revista Révolution Surrealiste.Em 1933, viaja a Madri, onde publica sua primeira novela. De volta a Cuba em 1939, alterna seu trabalho na rádio nacional com investigações musicológicas.Depois de um longo período na Venezuela (1945-1959), regressa a Cuba, onde desempenha diferentes funções políticas e docentes, tendo sido adido cultural em Paris.Em 1977, recebe o prêmio de literatura "Miguel de Cervantes". Um de seus mais interessantes aportes literários é o conceito do "real maravilhoso", desenvolvido no prólogo de seu romance El Reino de este Mundo. Este conceito é, sinteticamente, a coexistência em um mesmo espaço e tempo de dois mundos diferentes. Morre em Paris em 1980.


LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA MARTINS FONTES


PASSOS PERDIDOS

Ao fugir de uma vida árdua em Nova York, um musicólogo viaja para uma das raras regiões do mundo aonde a civilização não chegou – as altas extensões do rio Orinoco,tendo como missão a coleta de instrumentos musicais indígenas para uma das galerias de um museu organológico. À medida que ele penetra os labirintos da floresta, a viagem se revela também uma volta às etapas históricas mais significativas da América, ao tempo dos passos perdidos da humanidade: um lugar onde o progresso desvaneceu.
“Se, dentro dos cânones musicais, o jazz, a música popular e outros ritmos podem representar uma aproximação do homem com o próprio corpo e a natureza, fora deles restam ainda os ritmos primeiros, que mimetizam ou até são a natureza, quem sabe anteriores ainda à invenção da música como linguagem. E é dessa anterioridade que trata "Os Passos Perdidos". Neste romance, a arte como nós a conhecemos, formal e escrita, não mais redime, mas perde o homem civilizado, para sempre sentenciado à representação. Nele, um musicólogo de Nova York escapa para o rio Orinoco, atrás de uma suposta origem mimética dos instrumentos musicais. Embrenhado na floresta amazônica, descobre um tempo originário, onde a música não é atributo ou predicado de nada, ela somente é, assim como todo o resto.Fascinado pelo ser-em-si primitivo, o personagem não se dá conta de que a própria fascinação já é um afastamento e vai se perdendo, assim, de si mesmo e de tudo, condenado, como somos todos, à mordida irreversível da maçã. O que ocorre é que tudo isso é narrado de maneira tão arrebatadora que ficamos sem saber se preferimos a fonte original ou a civilização. Carpentier é prova de que o conhecimento também é capaz de nos reaproximar do incognoscível.”
(Noemi Jaffe, “Folha SP”, 19/10/2008)

ADORNO, THEODOR


THEODOR ADORNO

Adorno e a cultura de massa
Theodor Adorno, filósofo e sociólogo alemão, projetou-se como um dos críticos mais ácidos dos modernos meios de comunicação de massa. Ao exilar-se nos Estados Unidos, entre 1938 e 1946, percebeu que a mídia não se voltava apenas para suprir as horas de lazer ou dar informações aos seus ouvintes ou espectadores, mas fazia parte do que ele chamou de industria cultural. Um imenso maquinismo composto por milhares de aparelhos de transmissão e difusão que visava produzir e reproduzir um clima conformista e dócil na multidão passiva.
Theodor Adorno, nascido em Frankfurt, na Alemanha, em 1903, foi daqueles tantos intelectuais, cientistas, artistas, compositores e escritores alemães, que, na década de 1930, por serem de descendência judaica ou por inclinarem-se pelo socialismo, ou ambas as coisas, foram obrigados a emigrar para os Estados Unidos, naquilo que foi, talvez, a maior evasão de cérebros registrada na história contemporânea. Ele pertencia a um grupo de pensadores extremamente sofisticado que fazia parte da famosa Escola de Frankfurt, fundada em 1923, e que fora constrangido a sair do país nos anos seguintes da ascensão do nacional-socialismo ao poder.
É de se imaginar o contentamento dele quando, ainda na Suíça, no outono de 1938, recebeu um inesperado telefonema de Londres do seu particular amigo e parceiro, Max Horkheimer. Era um convite para que ele fosse à América para assumir uma pesquisa a serviço da Universidade de Princeton, a mesma que, em 1933, convidara Albert Einstein para integrar o seu corpo docente.
Tratava-se de um projeto e tanto, pois a Radio Research Projet queria saber tudo sobre os ouvintes norte-americanos. Nova Iorque provocou-lhe uma estranha reação. Chocou-o a convivência dos “palácios colossais...dos grandes cartéis internacionais”, com sombrios edifícios erguidos para os pequenos negócios, formando, no geral, um ar de cidade desolada. Nem mesmo o plano municipal de levar gente a morar nos subúrbios mais afastados, dando as residências um ar de individualidade, o consolou.


A estandartização americana
Para ele, um europeu refinado que passara boa parte da sua vida cultivando a música modernista de Alban Berg e, depois, a de Schönberg e sua atonalidade incidental, a América pareceu-lhe toda igual. Contraditoriamente, o país que mais celebrava e enaltecia a singularidade, a cada um procurar ser algo bem diferente dos demais, não parava de produzir e imprimir tudo idêntico, tudo estandartizado. A imensa rede de atividades que cobria toda a cidade era regida apenas pela ideologia do negócio. Numa sociedade onde as pessoas somente sorriam se ganhavam uma gorjeta, nada escapava das motivações do lucro e do interesse. Aprofundando-se no estudo da mídia norte-americana, entendeu que por detrás daquele aparente caos, onde rádios, filmes, revistas e jornais, atuavam de maneira livre e independente, havia uma espécie de monopólio ideológico cujo objetivo era a domesticação das massas. Quando o cidadão saía do seu serviço e chegava em casa , a mídia não o deixava em paz, bombardeando-o, a ele e à família, com programas de baixo nível, intercalados com anúncios carregados de clichês conformistas, comprometendo-o com a produção e o consumo.
Não se tratava, para ele, de que aqueles sem fim de novelas e shows de auditórios refletissem a vontade das massas, algo autêntico e espontâneo, vindo do meio do povo. Um anseio que os profissionais da mídia apenas procuravam dar corpo, transformando-os diversão e entretenimento. Ao contrário, demonstrava, isso sim, a existência de uma poderosa e influente indústria cultural que, de forma planejada, impingia aos seus consumidores doses cavalares de lugares comuns e banalidades, cujo objetivo era ajudar a reproduzir “o modelo do gigantesco mecanismo econômico” que pressionava sem parar a sociedade como um todo.
Lá, na América, não havia espaço neutro. Não ocorria uma cisão entre a produção e o lazer. Tudo era a mesma coisa, tudo girava em função do grande sistema. Dessa forma, qualquer coisa que causasse reflexão, uma inquietação mais profunda, era imediatamente expelida pela industria cultural como indigesta ou impertinente. Adorno, terminada a Segunda Guerra, voltou para a Europa, para Frankfurt, atarefado em reabrir a sua escola de sociologia. Morreu em 1969, arrasado com a humilhação que estudantes ultra-esquerdistas o submeteram, em plena sala de aula, durante a revolta de 1968/9.


Obras principais de Adorno

1933 - Kierkegaard. Konstruktion des Ästhetischen (Kierkegaard, a construção da estética)

1947 - Dialektik der Aufklärung. Philosophische Fragmente (A dialética do esclarecimento. Filosofia em fragmento), com Max Horkheimer)

1949 - Philosophie der neuen Musik (A filosofia da nova música)

1950 - The Authoritarian Personality (A personalidade autoritária) juntamente com E. Frenkel-Brunswik, D. J. Levinson e R. N. Sanford)

1951 - Minima Moralia. (Mínima morália)

1956 - Zur Metakritik der Erkenntnistheorie. (Sobre a metacrítica da teoria do conhecimento)

1967 - Negative Dialektik (Dialética negativa)

1970 - Ästhetische Theorie (Teoria estética)

1971 - Soziologische Schriften (Escritos sociológicos)


LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA DA UNESP

AS ESTRELAS DESCEM À TERRA: A COLUNA DE ASTROLOGIA DO LOS ANGELES TIMES

As Estrelas Descem à Terra é um texto sui generis no conjunto da obra de Theodor W. Adorno: por um lado, tem uma conexão direta com o núcleo duro do pensamento do filósofo, já que aborda temas como a interpenetração entre o racional e o irracional, o processo de dominação característico do capitalismo tardio, a cultura de massas etc. Por outro, trata-se de uma obra em que as idéias propriamente filosóficas de Adorno não ressaltam tão claramente como em outros de seus livros mais conhecidos. No que concerne ao background filosófico de As estrelas descem à Terra, a vinculação mais evidente é mesmo com a Dialética do Esclarecimento, obra em que Horkheimer e Adorno apontam para o fato de que o esclarecimento, longe de se limitar a um movimento intelectual europeu do século XVIII, o Iluminismo,tem suas raízes muito mais profundas na civilização ocidental, remontando à astúcia de Ulisses na epopéia homérica, no sentido de se valer de todos os meios que lhe eram disponíveis para alcançar o fim de retornar à ilha de Ítaca, onde, na qualidade de rei, era senhor de terras e rebanhos. Com isso querem os autores dizer que, adjacente a todo modelo de racionalidade que erige em fim último não a felicidade, mas objetos que, na verdade, seriam apenas meios de autoconservação da vida humana, reside uma indelével sombra da mais crassa irracionalidade.

LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA DA UNESP

INTRODUÇÃO À SOCIOLOGIA
Um dos grandes pensadores europeus de sua época se apresenta, neste livro, em uma atividade que poucos dos seus pares aceitariam. Em fase avançada da carreira, amplamente reconhecido, Adorno não hesita em ministrar curso introdutório à Sociologia para um público numeroso e sem preparo prévio. Logo em seguida, a expressão "fase avançada" serviria também para caracterizar sua vida, embora ninguém pudesse prevê-lo naquele momento de 1968, quando tinha 65 anos de idade. Morreria no ano seguinte, de enfarte, acossado por todos os lados - não só pela direita conservadora, como era de hábito - e após amargos embates com os militantes dos movimentos estudantis, que resultaram no cancelamento do curso de Sociologia preparado para 1969. Em uma das últimas aulas do curso de 1968 ele presta emocionada homenagem a colega recém-falecido, na qual enfatiza a tristeza, o desalento e as dúvidas do amigo sobre o acerto do retorno à Alemanha após a emigração, para comentar que ele próprio havia compartilhado esses sentimentos. Impossível não enxergar nessas palavras algo de premonitório.





SAFATLE, VLADIMIR P.


VLADIMIR PINHEIRO SAFATLE
Possui graduação em filosofia pela Universidade de São Paulo (1994), graduação em Comunicação social pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (1994), mestrado em Filosofia pela Universidade de São Paulo (1997) e doutorado em Lieux et transformations de la philosophie - Université de Paris VIII (2002). Atualmente é professor doutor do departamento de filosofia da Universidade de São Paulo. Foi professor visitante das Universidades de Paris VII e Paris VIII, além de responsável de seminário no Collège International de Philosophie (Paris). Desenvolve pesquisas nas áreas de: epistemologia da psicanálise, desdobramentos da tradição dialética hegeliana na filosofia do século XX e filosofia da música. É um dos coordenadores da International Society of Psychoanalysis and Philosophy.

LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA BOITEMPO

CINISMO E FALÊNCIA DA CRÍTICA (L!)

Um termo genérico e aparentemente pouco preciso – cinismo – é o ponto de partida de Vladimir Safatle em Cinismo e Falência da Crítica para entender as dinâmicas de racionalização que regem as várias esferas de socialização no capitalismo contemporâneo. Para o autor, é possível observar em dimensões relativamente autônomas da vida social uma certa racionalidade cínica, matéria-prima da organização das sociedades capitalistas atuais.Após a crise das antigas formas de pensar, uma certa estabilidade parece ter se enraizado, tornando dominante na sociedade contemporânea um pensamento único que impede a instauração de novas realidades. Em um contexto de relações sociais pautadas pela atitude cínica, decreta-se a falência de qualquer leitura crítica ou formas diversas de racionalização. Compreender o que o autor chama de “estabilização” desse estado de decomposição é um dos desafios da obra. Em Cinismo e falência da crítica, publicado pela Boitempo dentro da coleção Estado de Sítio, o cinismo aparece não somente como uma distorção em relação a princípios morais, mas descreve um descompasso na compreensão da racionalidade como processo de constituição de valores. O cinismo traria consigo a falência de certa forma de crítica social, afinal, em tal regime de “racionalidade cínica, não é mais possível pensar a crítica como indicação de déficits de adequação entre situações sociais concretas e ideais normativos”, diz Safatle. Os seis artigos que compõem o volume abordam, a partir dessa perspectiva, temas como dialética, sexualidade, estética e política, resgatando conceitos desenvolvidos por Adorno, Freud, Lacan e Hegel, entre outros pensadores, mostrando que o cinismo se alastrou em todas as esferas do pensamento crítico atual - e que problematizá-lo é preciso.

PECORARO, ROSSANO



Rosario Rossano Pecoraro

Possui graduação em Filosofia (1997) pela Università di Salerno (Itália), mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2002) e doutorado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2006). Ensaista e jornalista publicou vários livros e ensaios no Brasil e no exterior. É organizador da obra em 3 volumes "Os filósofos - Clássicos da Filosofia" (Editora PUC-Rio/Editora Vozes). Atualmente atua na coordenação executiva do "Instituto de Estudos Avançados em Humanidades" do Centro de Teologia e Ciências Humanas da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (IEAHu/PUC-Rio) e é professor do curso de pós-graduação latu sensu em Filosofia Contemporânea da mesma instituição. É membro do GT da ANPOF "Filosofia da História e Modernidade" e coordenador do "Fórum Krisis" de Filosofia, Humanidades e Ciências Sociais. As suas pesquisas, de cunho interdisciplinar, são dedicadas às relações entre niilismo, nada, negação e ao aprofundamento de questões de Filosofia Política; Filosofia e Teatro; Filosofia da Tecno-Ciência

LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA PUC/RIO – EDITORA VOZES

OS FILÓSOFOS - CLÁSSICOS DA FILOSOFIA ( L! )

Os Filósofos - Clássicos da filosofia é uma coletânea de ensaios, assinados pelos maiores especialistas brasileiros, sobre a vida e a obra dos autores clássicos da filosofia ocidental. A obra é distribuída em três volumes, que cobrem a vida e a obra dos grandes filósofos desde a Antigüidade clássica até a contemporaneidade. Cada ensaio traz os seguintes conteúdos: o filósofo e o seu tempo; a essência da sua filosofia; os conceitos-chave presentes na sua obra; os percursos e influências do seu pensamento; suas principais obras publicadas e uma seleção de textos, selecionados e traduzidos especialmente para essa obra.

BLOOM, HAROLD


HAROLD BLOOM


Harold Bloom é professor titular de Ciências Humanas, na Universidade de Yale, e já ocupou cátedra na Universidade de Harvard. Escreveu mais de 25 livros, entre os quais Hamlet: Poema Ilimitado, Gênio, Como e Por Que Ler, Shakespeare: A Invenção do Humano, O Cânone Ocidental, publicados pela Objetiva, além de O Livro de J e A Ansiedade da Influência. Ganhou o prêmio McArthur, da Academia Norte-Americana de Letras e Artes, e recebeu inúmeras distinções e diplomas honorários, inclusive a Medalha de Ouro de Crítica e Belles Lettres, conferida pela mesma academia, o Prêmio Internacional da Catalunha e o Prêmio Alfonso Reyes, do México. Bloom nasceu em Nova York, em 11 de julho de 1930.

LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA OBJETIVA

ANJOS CAÍDOS

Logo no primeiro parágrafo de Anjos Caídos, Harold Bloom mostra claramente o porquê deste seu ensaio: a fascinação ocidental pela figura dos anjos nas últimas duas décadas. Bloom demonstra um visível espanto diante da quantidade de livros e filmes em torno do universo angelical neste período. E inicia uma discussão mais profunda e contundente sobre o tema.Segundo o autor, existem três categorias simbólicas das religiões do Ocidente que se misturam muitas vezes, sem critérios de definição: os demônios, os diabos e os anjos caídos. Demônios e diabos são regularmente relacionados com o Mal no imaginário popular, enquanto os anjos caídos, apesar de caídos, ainda são anjos. O que, de certa forma, gera um certo glamour e uma aura sofisticada para esta última denominação.Mais uma vez Harold Bloom une seus incríveis conhecimentos acadêmicos em áreas incrivelmente distantes (como Teologia e estudos sobre Shakespeare) para criar um ensaio inovador e pertinente sobre um universo que, de tanto fascinar e se tornar presente no cotidiano ocidental, se transformou indevidamente em um espectro banal.Anjos Caídos conta ainda com as belas ilustrações de Mark Podwal, artista muito famoso nos Estados Unidos pelos seus trabalhos em capas de livros infantis e seus desenhos para o New York Times.

KAWABATA, YASUNARI


Yasunari Kawabata (Osaka, Honshu, 14 de junho de 1899 - Zuschi, 16 de abril de 1972)


Primeiro escritor japonês a ser laureado com o Prêmio Nobel de Literatura em 1968.

Enquanto criança, Kawabata desejava tornar-se pintor, mas optou por se tornar escritor após publicar alguns contos durante o tempo em que frequentava o liceu.
Ainda jovem foi marcado por acontecimentos trágicos e pela solidão, ficando órfão com três anos, passando então a ser criado pelos avós, no campo. Perdeu a avó com apenas sete anos, a única irmã com nove anos e o avô com catorze.
Estudava Literatura na Universidade Imperial de Tóquio quando formou, juntamente com Yijunutsy Richii, um jornal de letras – Bungei Jidai – que ajudava a promover um novo movimento literário (Shinkankakuha) que, segundo Kawabata e Yokomitsu, tinha como principais preocupações a apresentação de “novas sensações” na literatura, considerando a arte pura como missão primordial do escritor. Nessa revista publicou, em 1926, "Izu no Odoriko" ("A Dançarina de Izu"), uma história que explorava o erotismo do amor juvenil, com imagens líricas inspiradas em escrituras budistas e poetas medievais japoneses.O seu primeiro romance foi Yukiguni ("O País das Neves"), começado em 1934 e publicado gradualmente de 1935 a 1937. Relata a história de amor entre um homem diletante da cidade de Tóquio e uma gueixa de uma povoação remota onde este encontra um refúgio do stress da sua vida citadina. Este romance colocou Kawabata imediatamente na posição de um dos escritores japoneses mais importantes e promissores, tornando-se o romance num clássico instantâneo que é, hoje, considerado uma das suas mais importantes obras-primas.
Iniciou em 1949 a série "Mil Garças", em que consta o célebre "Nuvens de Pássaros Brancos", e "O Som da Montanha".
Após o final da Segunda Guerra Mundial
Kawabata continuou a publicar romances como Senbazuru, Yama no Oto, “A Casa das Belas Adormecidas”, Utsukushisa to Kanashimi to e Koto (“Kyoto” em Portugal). No entanto o romance que Kawabata considerava ser o seu melhor foi "Meijin", publicado entre 1951 e 1954.
Kawabata foi ainda membro da Academia Imperial e presidente do
Pen Club do Japão, atuando em várias reuniões internacionais de escritores.
Suicidou-se em meio a um surto depressivo, em Zushi, perto de Yokohama.
O estilo de escrita de Yasunari Kawabata distingue-se por uma linguagem suave, mais abstracta que descritiva, onde predomina a subjectividade em relação à objectividade, aproximando-se muitas vezes da prosa poética.
Por seu tratamento de atmosferas e cores, ficou conhecido como alguém que "pintava as palavras" de branco irradiante, praticamente sem outras cores, como se vê em "O País das Neves" e em "Nuvens de Pássaros Brancos".
A solidão, a angústia da morte e a atração pela psicologia feminina foram seus temas constantes.

LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA GLOBO


BELEZA E TRISTEZA

Traduzido do japonês para o inglês por Howard Hibbett (professor emérito de literatura japonesa em Harvard) e do inglês para o português por Alberto Alexandre Martins (poeta e artista plástico, ganhador do prêmio Jabuti), tem prefácio de Teixeira Coelho (professor da ECA-USP) e posfácio de Roberto Kazuo Yokota (mestre em filosofia pela USP).Como toda a obra de Kawabata, Beleza e Tristeza é o romance de um mundo globalizado. Não, porém, de maneira explícita, pois a globalização não é seu tema. Ela é sua circunstância. Escrevendo em meados do século XX, sua obra tem por contexto histórico a modernização voluntária do Japão antes da Segunda Guerra, e sua ocidentalização (ou americanização) compulsória depois da derrota. Isso se reflete no livro de muitos modos. Por um lado, a própria forma do romance realista-psicológico é ocidental. Por outro lado, a visão de mundo é japonesa. E se o romance, na sua origem, é narração, isto é, ação, na sua migração para o Japão se torna contemplação. Uma contemplação, porém, expandida para a dimensão de um romance, e perturbada pela presença do passado no presente, assim como pela invasão do presente de um passado ainda marcante.Nas palavras do posfaciador, “Cenários e objetos apresentados não apenas situam a ação, mas caracterizam especialmente a inação, mais precisamente, a contemplação da situação. Kawabata dá preferência a ambientes esvaziados, silenciosos, em momentos inertes. Quando figura situações movimentadas, sugere que são desagradáveis, ruidosas, perturbadoras. Assim, desde a primeira cena no trem vazio, [contempla-se] a paisagem do Monte Fuji, interrompido pela presença ruidosa de turistas americanos. [...] Paisagens e vistas panorâmicas são como que pintadas no texto. [E se] o cenário interessa, é pelo simbolismo da ausência, seja do passado histórico que assombra os monumentos, seja da melancolia da contemplação solitária, seja da catástrofe anunciada ao futuro”.A referência à “pintura textual” não é arbitrária. Além de indicar outra marca de hibridismo do romance, desta vez de linguagem, “as personagens principais gravitam em torno do mundo da arte, de uma arte japonesa evanescente, vinculada a uma tradição sobressaltada pelo processo de modernização. Oki Toshio, escritor reconhecido, busca a reconciliação com sua antiga amante, Ueno Otoko, renomada pintora. [...] Oki faz sucesso com o romance que descreve a intensa relação clandestina mantida com Otoko, então adolescente, assim como a trágica sina da jovem após o rompimento. [...] No romance de Oki, como na pintura de Otoko, há a referência nostálgica – mesmo que indireta e simbólica – à separação, não apenas de um amor irresolvido, mas de todo um mundo dolorosamente desfeito. [...] A reconciliação de Oki e Otoko é impossível, a despeito de seus desejos; o mundo que os unia, inexiste. Todavia, foi o distanciamento e o desaparecimento desse mundo que propiciou sua arte”. E a de Kawabata.

CORTÁZAR, JULIO


JULIO CORTÁZAR


Belga de pais argentinos, voltou à Argentina aos quatro anos de idade. Filho de pai Diplomata. Seus pais se separaram posteriormente e foi criado pela mãe, uma tia e uma avó. Formou-se professor e lecionou em algumas cidades do interior do país, inclusive na Universidade de Cuyo, mas renunciou ao cargo quando Perón assumiu a presidência. Em 1951, Cortázar, por não concordar com a ditatura na Argentina, partiu para Paris (França), onde trabalhou como tradutor da Unesco e viveu até a sua morte, por leucemia, em 1984. Foi enterrado no cemitério de Montparnasse.
Em 1961, Cortázar visita Cuba pela primeira vez, época de intensificação de seu fascínio pela política. No mesmo ano teve um livro traduzido para o inglês. Em 1962, lança "Historias de Cronopios y Famas". 1963 marcou o lançamento de "Rayuela", que teve cinco mil cópias vendidas no mesmo ano. Em 1959 saiu o volume "Final del Juego". Seu artigo "Para Llegar a Lezama Lima" foi publicado na revista "Union", em Havana. Depois desses anos, Cortázar se comprometeu politicamente na libertação da América Latina sob regimes ditatoriais.
Seu livro mais conhecido é o romance O Jogo da Amarelinha (1963), que permite várias leituras orientadas pelo próprio autor. É autor de contos considerados como os mais perfeitos no gênero, maior parte de sua obra, reunidos em livros como Bestiário (1951), Final de Jogo (1956), Todos os Fogos o Fogo (1966) e As Armas Secretas (1959), para citar apenas alguns.
Cortázar inspirou um grande número de cineastas, entre eles o italiano Michelangelo Antonioni, cujo longa-metragem Blow-up foi baseado no conto As Babas do Diabo (do livro As Armas Secretas).
O escritor morreu em Paris, de leucemia, em 1984.

LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA


O JOGO DA AMARELINHA


Em 1963, um romance de Julio Cortázar se junta à série de grandes obras publicadas por escritores latino-americanos. Um livro difícil, que apresenta uma série de técnicas inovadoras e se inscreve dentro do espírito da vanguarda. Vinte anos depois, 'O Jogo da Amarelinha' é consagrado um clássico, uma das obras mais importantes da literatura de língua espanhola ao lado de Cem anos de solidão, de Gabriel Garcia Márquez. 'O jogo da Amarelinha' é um labirinto literário no qual Cortázar discute os questionamentos do homem diante de seu destino, conflitos, dúvidas e paixões. Dividido em três partes, pode ser lido de diversas formas. Cada leitor cria o seu próprio livro e ritmo.

CARPEAUX, OTTO MARIA

OTTO MARIA CARPEAUX



Otto Maria Carpeaux (Otto Karpfen, de nascimento), filho de pai judeu e mãe católica, nasceu em Viena (Áustria), em 9 de Março de 1900, onde cursou o ginasial. Ingressou na faculdade de direito, por sugestão familiar, abandonando-a um ano depois. Estudou filosofia (doutorou-se em 1925), matemática (em Leipzig), sociologia (em Paris), literatura comparada (em Nápoles) e política (em Berlim); além de dedicar-se à música.
Em
1930 casou-se com Helena Carpeaux.
Dedica-se intensamente à
literatura e ao jornalismo político. Converte-se à religião católica e torna-se homem de confiança de dois primeiros-ministros em Berlim, Engelbert Dollfuss e Kurt Schuschnigg, os últimos primeiro-ministros antes do Reich Alemão, respectivamente, o que o obrigando a seguir para o exílio. Em princípios de 1938 foge com a mulher para Antuérpia (Bélgica), onde ainda trabalha como jornalista na Gaset Van Antwerpen, maior jornal belga de língua holandesa.No Brasil
Diante da escalada
nazista, Carpeaux ainda sente-se inseguro e foge com a mulher, em fins de 1939, para o Brasil. Durante a viagem de navio, estoura a guerra na Europa. Recusando qualquer conciliação com o que estava acontecendo no Reich, muda seu sobrenome germânico Karpfen para o francês Carpeaux.
Ao desembarcar, nada conhecia da
literatura brasileira, nada sabia do idioma e não tinha conhecidos. Na condição de imigrante, foi enviado para uma fazenda no Paraná, designado para o trabalho no campo.
O cosmopolita e erudito Carpeaux ruma para
São Paulo. Incialmente passa dificuldades, sem trabalho, sobrevive à custa de desfeitas de seus próprios pertences, inclusive livros e obras de arte. Autodidata, o homem que já sabia inglês, francês, italiano, alemão, espanhol, flamengo, catalão, galego, provençal, latim e servo-croata, em um ano aprende e domina o português.
Em
1940, tenta ingressar no jornalismo nacional, mas não consegue. É então que escreve uma carta a Álvaro Lins, a respeito de um artigo sobre Eça de Queiroz. A resposta é feita em forma de um convite, em 1941, para escrever um artigo literário para o Correio da Manhã, do Rio de Janeiro. Seu artigo é publicado e um emprego é garantido. Iniciava uma publicação regular. Até 1942, Carpeaux escrevia os artigos em francês, que eram traduzidos.
Mostrando sua grande inteligência e erudição, divulgou autores estrangeiros e tornou-se um grande crítico literário. Nesse mesmo ano de
1942, Otto Maria Carpeaux naturalizou-se brasileiro. Ainda nesse ano, publica o livro de ensaios Cinzas do Purgatório.
Entre
1942 e 1944 Carpeaux foi diretor da Biblioteca da Faculdade Nacional de Filosofia. Em 1943, publica Origens e Fins.
De
1944 a 1949 foi diretor da Biblioteca da Fundação Getúlio Vargas. Em 1947 publica sua monumental História da Literatura Ocidental - o mais importante livro do gênero em língua portuguesa. Em 1950, torna-se redator-editor do Correio da Manhã. Em 1951, publica Pequena Bibliografia Crítica da Literatura Brasileira, obra singular na literatura nacional - reunindo, em ordem cronológica, mais de 170 autores de acordo às suas correntes, da literatura colonial até nossos dias. Sua produção crítica literária é intensa, escrevendo em jornais semanalmente.
Em
1953, publica Respostas e Perguntas e Retratos e Leituras. Em 1958, publica Presenças, e em 1960, Livros na Mesa.
Carpeaux foi forte opositor do
Golpe Militar, em 1964, redigindo artigos acerca da retrógrada autoridade da então nova ordem miltiar, participando de debates e eventos políticos.
Em
3 de fevereiro de 1978, sexta-feira de Carnaval, morre no Rio de Janeiro, de ataque cardíaco.


LIVRO ESCOLHIDO - EDIÇÕES DO SENADO FEDERAL


HISTÓRIA DA LITERATURA OCIDENTAL - 4 VOLUMES


Essa extensa obra aborda a herança da literatura grega, o mundo romano, o cristianismo, a fundação da Europa, o universalismo cristão, a literatura dos castelos e aldeias, a oposição burguesa e eclesiástica, a transição do Trecento, a Renascença e Reforma no Quatrocento e Cinquecento, o Barroco e Classicismo, o Rococó e a revolução pré-romântica, o Romantismo, a literatura burguesa do Realismo ao Naturalismo, o Fin de Siécle do Simbolismo até as revoltas modernistas e as tendências contemporâneas.
HÉLIO PELLEGRINO(05/01/1924 – 23/03/1988)




Permito-me, ao invés de uma pequena biografia, reproduzir matéria publicada na revista Teoria e Debate, n.3, de junho de 1988.

Memória: Hélio Pellegrino – Um homem e seu pensamento.

(por Maria Rita Kehl e Humberto Werneck*)

 
Uma semana antes de sua morte (causada pelo terceiro infarto, em março passado), Hélio Pellegrino escrevia mais um artigo para o Jornal do Brasil (16/3/88) narrando o tortuoso episódio que culminou com a cassação do registro do Dr. Amílcar Lobo pelo CRM (Conselho Regional de Medicina) devido à sua participação e conivência, como médico militar, na tortura política dos anos 70 — inclusive no episódio da morte do ex-deputado Rubens Paiva. O envolvimento político do psicanalista Hélio Pellegrino no processo de denúncia e esclarecimento da participação de Lobo na tortura (com a cumplicidade do analista-didata deste, Dr. Leão Cabernite) valeu-lhe a expulsão da SPRJ (Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro), em 1980, junto com seu colega Eduardo Mascarenhas.
Pudera. Escrevendo, discutindo e analisando a relação entre a instituição psicanalítica, o poder, a tortura e os direitos humanos; diferenciando com clareza os pudores corporativistas que protegem as castas médicas dos verdadeiros e rigorosos princípios éticos que fundam e legitimam a prática da psicanálise, Hélio Pellegrino corajosamente arrancou o véu de formalidade e silêncio que protegia e poupava os membros das sociedades psicanalíticas de se defrontarem, como seres humanos e políticos, com os acontecimentos de seu tempo. A atuação de Hélio, seus artigos e reflexões sobre a verdadeira ética da psicanálise sacudiram a poeira de todos os consultórios brasileiros, tiraram os divãs de um limbo atemporal em que se tratava o inconsciente como pura idéia imaterial e desvinculada da história, para nos situar (como quis Freud, há cem anos) num lugar absolutamente humano, envolvido com matéria carnal e social, tendo o amor como maior recurso e a liberdade como objetivo. Para Hélio, "liberdade é ação, é coisa encarnada, inserida no real com objetivo de transformá-lo, modelando-o (...) Não há liberdade abstrata, nobre princípio apenas retórico, a ser festejado e exaltado em cerimônias patrióticas. A liberdade é centro da condição humana. Não se concebe analista como o Dr. Cabernite, que, em nome de uma pretensa neutralidade, não se empenhe de corpo e alma em analisar e curar seu cliente da psicopatologia que fez dele um homem envolvido na tortura de outros homens; assim como não se concebe médico como o Dr. Lobo, que assistia cidadãos torturados, alguns até a morte, sem denunciar o sadismo institucionalizado que os estava vitimando. Se os Dr. Lobo e Cabernite correriam riscos? São riscos da profissão, de quem se envolve com matéria humana, emocional, obscura às vezes, perigosa sempre. Se não queriam riscos, deveriam ter ficado na botânica, na veterinária ... "O psicanalista é o contrário do burocrata ou do especialista. Ele escuta o desejo, debruçado sobre o coração selvagem da vida e, a partir desse pólo, se esgalha, ampliadamente, em todas as direções (...) Você é um centro pessoal de transformação do mundo. Só sua prática nesse sentido é que dirá a você o que fazer e o que mudar, inclusive na sua vida e na própria profissão.Assim viveu Hélio Pellegrino: esgalhando-se, ampliadamente, em todas as direções, acertando e errando, pagando alto preço de sua ousadia em fazer da própria vida um exercício de liberdade. Embora não compartilhe de sua fé religiosa, reconheço na atuação analítica, política e também poética de Hélio Pellegrino uma espécie de vínculo permanente com o aspecto sagrado da vida, esta única chance que nos é dada de participar da comunidade humana e do cosmo, e com a qual temos um único compromisso: o de não fazê-la pequena, mesquinha, covarde. Não desperdiçar a vida, não desperdiçar o manancial de amor que existe em cada um de nós.
Hélio Pellegrino morreu do coração no dia em que o governo Sarney derrotava por meio de uma Constituinte majoritariamente corrompida, mais uma esperança de eleições diretas, agora em 1988. Depois do duro impacto que foi a notícia de sua morte repentina, depois de algumas horas parada diante do vazio que sempre nos deixa o desaparecimento de uma pessoa querida e admirada, compreendi que só morre do coração quem tem coração. A coletânea que se segue, de trechos de seu pensamento sobre vários assuntos, não pretende dar conta da complexidade e da amplitude do personagem Hélio — ela é só uma pequena amostra dos caminhos que ele percorreu e desbravou com lucidez e coragem; com a inteligência e o coração.
(*Maria Rita Kehl é psicanalista e escritora.)
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A 23 de março passado, quando um infarto matou Hélio Pellegrino, no Rio de Janeiro, não foram poucas as tentativas de capturar com palavras a sua figura múltipla. "Ele foi o poeta da psicanálise", escreveu o repórter José Castello, no Jornal do Brasil. "Um inacreditável homem-e-meio", disse o advogado e professor de direito Nilo Batista. "O melhor exemplo do homem sem medo", observou o jornalista e escritor Cícero Sandroni. "Ninguém como ele sabia falar e escrever a palavra mais certa para abalar a iniqüidade e despertar o sentimento fraterno", declarou o ensaísta e professor Antonio Candido, que concluiu: "Foi luminoso e é insubstituível". A definição mais exata de Hélio Pellegrino, no entanto, talvez tenha sido dada por ele próprio, num artigo que dedicou à memória do indigenista Noel Nutels, quando de sua morte, em 1973. Era um homem desatado, verdadeiro, caloroso", anotou Hélio, como se falasse de si mesmo. "Sua capacidade de aceitar o Outro fazia com que este se sentisse, irresistivelmente, convidado para a festa do diálogo, da amizade, da comunicação."Festa que este poeta, psicanalista, escritor e ativista político, mineiro de Belo Horizonte, animou como ninguém em seus 64 anos de vida. Raras pessoas terão sabido, como ele, combinar ação e pensamento. Dono de uma capacidade verbal assombrosa, batalhou por meio de ensaios, palestras, debates, conferências e artigos na imprensa. Mas não ficou sendo um intelectual de gabinete: levou seu verbo também para as praças, ruas, palestras, e por causa dele amargou três meses de prisão sob o AI-5, em 1969. Psiquiatra e, mais tarde, psicanalista, concebia seu ofício como um instrumento de libertação — mas não se limitou a exorcizar os fantasmas que rondam os divãs: combateu igualmente os vícios e monstruosidades que, aos poucos, se vão grudando no casco da instituição psicanalítica.
No caso da Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro (SPRJ), de que foi membro, Hélio Pellegrino denunciou não apenas o poder imperial dos burocratas que a comandavam como também o acobertamento, por esses dirigentes, de um associado, Amílcar Lobo, que colaborara com a tortura a prisioneiros políticos no início dos anos 70. A denúncia lhe custou a expulsão da SPRJ, à qual só conseguiu retornar pela via judicial. Pouco antes de morrer, colheu um vitória quando o Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro cassou o registro de Amílcar Lobo, impedindo-o de exercer a profissão. "Pela primeira vez desde 1964", observou Hélio num artigo; "alguém é punido por ter-se envolvido, na condição de militar, com a tortura política".Apaixonado pela justiça, ele carregava em seu final de vida um sonho obsessivo: ver reaberto o caso Riocentro. Uma semana antes de sua morte, o Superior Tribunal Militar decidiu pelo arquivamento do inquérito aberto para apurar esse atentado terrorista com que a extrema-direita, no dia 30 de abril de 1981, pretendeu semear o pânico e a morte entre as 30 mil pessoas que assistiam a um show de música promovido por organizações democráticas. O inquérito policial-militar, como se previa, não avançou um milímetro na direção da verdade.Hélio Pellegrino nunca se conformou com isso. No último parágrafo de seu último artigo, publicado postumamente, citava o ministro do Exército, general Leônidas Gonçalves, que a propósito de outro episódio falara em "honra militar". "Em nome dela é que o IPM do Riocentro deveria ter sido reaberto", argumentou Hélio. O escritor Otto Lara Resende, seu amigo, conta que ele andava siderado pelo conceito de honra e lia muito sobre o tema — mergulhara, com especial interesse, nos textos do escritor católico francês Georges Bernanos. "Estava se preparando para escrever um longo artigo sobre o Riocentro", revela Otto Lara Resende, lembrando que Hélio morreu com outra frustração: horas antes do infarto fatal, já hospitalizado, viu a Constituinte aprovar a emenda que praticamente liquidou a esperança de eleições diretas para presidente este ano.
A morte poupou-o de mais um pesado golpe: internado no Instituto Brasileiro de Cardiologia, em Ipanema, não chegou a saber do melancólico fechamento da Clínica Social de Psicanálise, decidida em assembléia da entidade na noite de 22 de março. "A clínica morreu com ele", diz com amargura o psicanalista carioca João Batista Ferreira, que ajudou a pôr de pé essa utopia sonhada por Hélio Pellegrino. A idéia era colocar a psicanálise ao alcance das camadas mais pobres da população. "O operário só entra no meu consultório como bombeiro ou pintor de paredes, jamais como cliente", disse ele certa vez. "Só entra quem paga meu preço, e o preço é a nossa linha de partilha severa, o leão-de-chácara na porta do consultório, que tem a arrogância de barrar a imensa maioria do povo brasileiro. O preço é uma determinação do mercado, o ponto em que a psicanálise se articula com a política".
Como driblar esse nada manso leão-de-chácara? Hélio imaginou um banco de horas em que cada profissional ligado ao projeto depositaria duas horas de atendimento gratuito por semana. Os clientes pagariam quantias simbólicas pelos serviços, que consistiriam em terapia de grupo para adultos e adolescentes e ludo-terapia para crianças, além de orientação para os pais. Implantada em 1973, a Clínica Social de Psicanálise foi sendo lentamente sufocada por problemas financeiros, como a alta perpétua dos aluguéis. Resta o consolo de saber que não desapareceu sem deixar traços. "Foi uma fagulha irradiadora", avalia João Batista Ferreira. "Hoje, várias sociedades psicanalíticas têm suas clínicas sociais". Em 1981, ainda vicejante, a entidade, numa iniciativa sem precedentes, estendeu seu raio de ação até uma favela carioca, o Morro dos Cabritos. No tempo da ditadura, chamou a si a tarefa de dar cobertura a militantes políticos que precisavam deixar o país.
A clínica promoveu ainda fecundos simpósios sobre psicanálise. Um deles em particular, dedicado ao tema Psicanálise e Política, em setembro de 1980, teria importantes desdobramentos: foi nessa oportunidade que Hélio Pellegrino, ao lado de dois colegas, Eduardo Mascarenhas e Wilson Chebabi, abriu fogo contra os barões da instituição, denunciando seus privilégios, seu pretenso apolitismo e os altos custos do tratamento. Começava uma pequena revolução. "A história das instituições psicanalíticas brasileiras se divide em antes e depois de Hélio Pellegrino", demarca Eduardo Mascarenhas, para quem o colega morto, entre outros méritos, teve o de "tirar a psicanálise , de seus castelos mal-assombrados e transportá-la para o espaço público"."Incansável Dom Quixote a lutar contra dragões reais que nada tinham de moinhos de vento", como o descreveu Cícero Sandroni, Hélio Pellegrino já nasceu marcado por essa vocação. "Nas minhas lembranças mais remotas eu o vejo indignado com os absurdos do país", depõe o crítico de teatro Sábato Magaldi, seu primo e companheiro de infância em Belo Horizonte. "Ele tinha uma espécie de ira santa". Ira que, uma vez provocada, desconhecia barreiras e convenções. Certa madrugada — quem conta é outro amigo de juventude, o radiologista Eloy Heraldo Lima, seu colega de faculdade —, Hélio Pellegrino passava pela Praça da Estação, em Belo Horizonte, quando deparou com dezenas de famílias de indigentes dormindo ao relento. Indignado, buscou um telefone e interrompeu o sono do arcebispo da cidade, Dom Antônio dos Santos Cabral, para exigir — inutilmente — que ele, primeiro, fosse ver o triste espetáculo, e em seguida acolhesse aquela gente em seu palácio, afinal de contas "uma casa de Deus.
A história é contada no romance O Encontro Marcado, de Fernando Sabino, do qual um dos personagens principais, Mauro, não disfarça o perfil exuberante de Hélio Pellegrino. Este livro, que já vendeu mais de 50 edições desde 1956, além de traduções para várias línguas, eterniza a amizade que, na vida real, uniu quatro escritores mineiros ao longo de meio século: Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino e Hélio Pellegrino. Os quatro "vintanistas", como os chamava carinhosamente seu mestre Mário de Andrade. No caso dos dois últimos, os laços eram ainda mais antigos, pois se conheceram nos bancos do Jardim da Infância Delfim Moreira, em Belo Horizonte. "Perdi uma grande parte de mim, e com certeza a melhor", disse Fernando Sabino ao ver decepada essa camaradagem de 60 anos.Há quem sustente que, dos quatro, Hélio "era o menos mineiro". Nada tinha, em todo caso, da proverbial contenção montanhosa — quem sabe pelo fato de ser filho e neto de italianos. "Brasileiro, mineiro, belo-horizontino, era italiano como quem mais o fosse", disse dele o historiador Francisco Iglésias, em homenagem que lhe prestou no Conselho Federal de Cultura. Ardia em Hélio Pellegrino aquela desmesura que o fascinava na figura de Noel Nutels. "Era uma personalidade solar, que irradiava de maneira incrível a inteligência e a generosidade", observa Antonio Candido, seu companheiro de Esquerda Democrática, Partido Socialista e, por fim, Partido dos Trabalhadores. "Nada de fechado nele. Tudo aberto, para deixar passar a força de vida e para receber a força da vida. Homem de justiça e de combate, ele se jogava com a intensidade da paixão, fosse raiva contra o mal, fosse a mais ruidosa alegria diante do bem.
Para Iglésias, que com ele conviveu desde a juventude, Hélio era "um homem-comício" — "um extraordinário orador, de linguagem incisiva, de forte beleza poética, imagens ousadas, de voz firme e sonora, servido por sua bela estampa". O jornalista carioca Moacir Werneck de Castro, que o conheceu mais tarde, carrega no mesmo adjetivo para qualificar Hélio Pellegrino: "Era dono de uma opulência verbal extraordinária, as palavras lhe vinham com extraordinária facilidade, num submisso tropel. Gostava de jogar com elas, de as dissecar, esbagaçar e remontar, de tirar efeitos inesperados de suas assonâncias — e dissonâncias". Não se perdia, entretanto, "no fluxo vocabular, não se deixava arrastar por ele. Guardava seguro o equilíbrio entre a forma exuberante, barroca, e o claro conteúdo do pensamento.
Tão bem dotado para a tribuna, o palanque, era fatal que Hélio Pellegrino cedo se entregasse à paixão da política embora sua mocidade transcorresse sob a repressão da ditadura do Estado Novo. Até isso parecia movê-lo. "A guerra e a política nos marcaram profundamente", disse numa entrevista. "Nossas esperanças eram centradas no pós-guerra, na vitória da justiça, da liberdade, da fraternidade".Assim, aos 20 anos, fundou em Belo Horizonte uma Liga Intelectual AntiFascista. Juntou-se, por essa época, ao grupo que iria editar na capital mineira um panfleto clandestino, Liberdade (nome proposto, a pedido de Hélio, pelo escritor Georges Bernanos, que vivia então em Minas). Era impresso numa velha máquina temerariamente instalada atrás do prédio da Secretaria da Segurança Pública. A publicação, em 1945, ano da redemocratização, ganhou existência legal e sobreviveu por alguns meses, como jornal diário. "Passávamos o dia inteiro de cuecas imprimindo o jornalzinho", contava Hélio Pellegrino, que assinava com o pseudônimo Mário Sobral (tomado de empréstimo a Mário de Andrade) uma crônica com muita gozação em cima dós políticos que apoiavam o governo.Deposto Vargas, Hélio embarcou com entusiasmo na recém-criada União Democrática Nacional (UDN), que ainda não adquirira sua fisionomia conservadora. Era estuário natural da gente de esquerda que não fechava com o Partidão. Mais exatamente, na ala da UDN que ficou conhecida como Esquerda Democrática. Foi por essa facção que Hélio, ainda estudante, aos 21 anos, saiu candidato a uma cadeira de deputado federal na Constituinte de 1946. "Ele fez uma campanha curtíssima, só quinze dias, e por pouco não se elegeu", lembra sua viúva, a psicóloga Maria Urbana Pentagna Guimarães Pellegrino, com quem teve seus sete filhos (nos últimos 27 meses, vivia com a escritora gaúcha Lya Luft; costumava dizer que "o casamento feliz é uma penitenciária de cinco estrelas").Da Esquerda Democrática, Hélio saltou para o pequeno e aguerrido Partido Socialista Brasileiro, o PSB, do qual viria a ser uma das figuras principais em Minas. "Foi uma experiência tumultuada", rememora o escritor Marco Aurélio de Moura Matos, que foi presidente da seção mineira do partido. "A direção nacional não nos entendia, era muito acadêmica, tinha até um certo ranço stalinista". Do outro lado, Hélio e seus companheiros sofriam ataques do Partidão, que os acusava de trotskismo. "O que éramos mesmo é anti-stalinistas", precisa outro antigo dirigente do PSB de Minas, o jornalista José Maria Rabêlo, hoje presidente da seção estadual do PDT (Partido Democrático Trabalhista). "Nós acreditávamos que a revolução não podia ser feita para implantar outro totalitarismo". Rabêlo se recorda de Hélio Pellegrino "menos como um construtor de partido do que como um teórico brilhante". O que não o impedia de sair às ruas para liderar, por exemplo, duas greves históricas, dos bancários e dos condutores de bonde. Participou também de um esforço pioneiro para organizar a população de periferia, na favela conhecida como Vila dos Marmiteiros. Já formado em medicina, Hélio ligou seu nome a uma ruidosa campanha para expulsar o então governador Juscelino Kubitschek que era urologista — da Associação Médica de Minas Gerais. Juscelino havia negado aumento de ordenado e melhores condições de trabalho para os médicos do serviço público estadual. "Conseguimos expulsar o homem", conta o radiologista Eloy Lima, outro líder do movimento.
Nessa época, Hélio já havia escolhido a psiquiatria, a partir de um episódio decisivo, que relataria anos mais tarde num belo artigo, "Minha vida com os neuróticos". Durante uma aula de fisiologia nervosa, no segundo ano do curso, o professor ilustrava, na pessoa de um velho marinheiro, a doença chamada tabes dorsal. Sentindo-se reduzido a objeto, a coisa, no centro do anfiteatro repleto de estudantes, o homem, de repente, urinou na roupa — e, vexado, não pôde conter também as lágrimas. "Meu colega Eloy Lima percebeu juntamente comigo o acontecimento espantoso, e fomos três a chorar", escreve Hélio em seu artigo. "O choro do velho, seu desamparo, sua figura engrouvinhada sobre a qual parecia ter-se abatido todo o inverno do mundo, tudo me surgiu de repente como um tema de meditação, a partir de cuja importância poderia eu, quem sabe, encontrar caminho. A meus olhos, a tabes dorsal integrou-se numa pessoa humana visada como um todo. Esta totalidade única e indissolúvel deveria tornar-se objeto de ciência.
Foi em busca dessa trilha que Hélio, formado em 1947, enveredou pela psiquiatria, para desaguar em seguida na psicanálise. Não é verídica a história, integrante de seu copioso folclore, segundo a qual ele teria colocado à porta de seu primeiro consultório uma tabuleta dizendo que "só um louco procura o psicanalista Hélio Pellegrino".(A frase tem toda cara de Otto Lara Resende", desconfia Marco Aurélio de Moura Matos). Mas poderia perfeitamente ser de Hélio Pellegrino, um homem que nunca perdeu a capacidade de rir e de brincar. "As pessoas graves, sérias, compostas, morrem ainda em vida, e se tornam o busto de si mesmas", advertia. Sabia como poucos manejar a arma do humor. Numa passeata, por exemplo, no centro do Rio de Janeiro, nos anos 60, os manifestantes foram subitamente surpreendidos pela entrada em cena do brucutu, o assustador veículo que a polícia usa para dispersar multidões com jatos de água. Mas das mangueiras da fera, naquele dia, não saiu mais que um ralo fio de água. "Pessoal, o brucutu brochou!", pôs-se a berrar Hélio Pellegrino, provocando gargalhadas e desmoralizando a repressão.Em outra ocasião, lembra Moacir Werneck de Castro, envolveu-se num incidente de trânsito; quando a pessoa com quem discutia informou que era uma alta patente militar, Hélio bateu de joelhos no asfalto e clamou, com as mãos postas: "Um marechal! Meu Deus, eu não mereço tanto!" Algumas de suas brincadeiras entravam na conta de um lirismo temperado pelo anarquismo — ou vice-versa. Foi assim em São Paulo, no ano de 1945, quando tomou nos braços a figura miúda de Monteiro Lobato e disparou com ela pela avenida São João, conta o poeta Paulo Mendes Campos: "Lobato, possesso, bradava 'pusilânime!', e o nosso amigo tentava explicar-lhe que estava apenas realizando uma complicada aspiração de infância: carregar no colo o mágico de seu mundo infantil.
Seu amor pela brincadeira, no entanto, nunca impediu que Hélio Pellegrino encarasse com exemplar seriedade as tarefas, profissionais ou não, que tinha pela frente. Solicitado por todos os lados, raramente se recusava a prestar os serviços que lhe pediam — escrever um artigo, redigir um manifesto, participar de um debate. Nos últimos anos, entre inúmeros compromissos que aceitou, fez parte da Comissão Teotônio Vilela, por melhores condições carcerárias, e do grupo Tortura Nunca Mais. Tinha prodigiosa capacidade de trabalho e passava mais de dez horas por dia no consultório — "puxando minha carroça", como dizia. Como militante, foi pouco típico e não raro dissentiu. Levado ao PT pela mão do crítico e teórico de arte Mário Pedrosa, Hélio dizia que pela classe trabalhadora era capaz de tudo, até de agüentar reuniões muito compridas. Não obstante, era o que acabava fazendo com muita freqüência — como atesta o psicanalista Carlos Alberto Barreto, seu companheiro de militância no PT.
Os dois ajudaram a criar, dentro do partido, no Rio, o Núcleo (hoje Clube) Mário Pedrosa, grupo informal de intelectuais e artistas que se reúnem toda sexta-feira em casa de Barreto para discussões políticas.Ali se travaram debates inflamados — por exemplo, sobre se o PT devia ou não ir ao Colégio Eleitoral. Hélio, simpatizante de Tancredo Neves, mais tarde admitiu que boa parte dos atuais problemas brasileiros decorre da eleição indireta de janeiro de 1985. "Ele não tinha essa coisa da verdade absoluta", chama atenção Carlos Alberto Barreto. Era, para todos os efeitos, um homem aberto e tolerante — a tal ponto que sua flexibilidade por vezes deixava desconcertados os próprios amigos. Uma boa ilustração disso foi o episódio de sua prisão, em 1969. Durante o ano anterior, de grande agitação política, Hélio escreveu artigos incandescentes no hoje desaparecido Correio da Manhã. Além disso, participou de passeatas, discursou em praça pública, integrou comissões formadas para parlamentar com as autoridades.
Mas o que de fato pesou contra o psicanalista foi a imagem que dele projetou nessa época o dramaturgo Nelson Rodrigues, adepto da ditadura. Amigo e admirador de Hélio, Nelson converteu-o num dos personagens obsessivos de suas crônicas de jornal. Hiperbólico, pintava-o ali como um líder carismático capaz de incendiar multidões com "sua voz de barítono". Os militares, parece, tomaram ao pé da letra os arroubos retóricas do cronista: no primeiro dia de vigência do AI-5, 13 de dezembro de 1968, mandaram prender o psicanalista, que passou semanas escondido antes de se apresentar aos militares, em fevereiro — sob a proteção de Nelson Rodrigues, aliás. Muitos de seus amigos, nesse momento, não entendiam por que Hélio, tendo sido levado àquela aflitiva situação por causa de Nelson, não rompia com ele. Um desses companheiros, o jornalista Zuenir Ventura, que também estava preso, conta que nem quis ser apresentado ao cronista quando este foi visitar Pellegrino no cárcere. Logo compreendeu que uma das virtudes mais invejáveis de Hélio era, exatamente, "a sua capacidade de perceber, na pessoa, todos os pedaços dela". "Com ele aprendi que você pode ser radical sem ser sectário", diz o jornalista. "Nem mesmo nos momentos em que o radicalismo fervia, em 1968, Hélio deixou de ser plural.
Nelson Rodrigues, em suas crônicas, falava de Pellegrino como "o nosso Dante". Exageros à parte, não resta dúvida de que ele foi um poeta de alta qualidade, saudado em seus começos como um dos talentos mais puros de sua geração. Tinha enorme facilidade para versejar — o professor Antonio Candido se lembra das estrofes quinhentistas ("muitas vezes obscenas") que ele produziu de improviso, em mesas de bar. Maria Urbana, sua viúva, diz que Hélio nunca deixou de fazer poesia. Mas, por alguma razão, não quis publicar, a não ser esparsamente, em jornais e revistas (em 1980, gravou alguns poemas no disco Os 4 Mineiros). Livro, mesmo, se assim se pode chamar, só o Poema de Príncipe Exilado, volume com pouco mais de vinte páginas lançado em Belo Horizonte em 1947. Recusou, certa ocasião, o oferecimento de uma editora paulista para publicar Os Melhores Poemas do Hélio Pellegrino, alegando, com graça, que os textos não incluídos passariam automaticamente a ser "os piores poemas de Hélio Pellegrino.
Como prosador, limitou-se a participar de obras coletivas, como Crise na Psicanálise, de 1982, e Os Sentido da Paixão, um dos best-sellers do ano passado, no qual assina um ensaio sobre o mito de Édipo. A explicação para a sua inapetência editorial pode estar numa confissão que fez em 1979: "Fiquei dividido entre uma identidade de escritor, que não cheguei a realizar, e a identidade de psicanalista, que eu assumo", constatou, evasivo, numa entrevista. "Talvez eu seja exigente ou vaidoso demais". Otto Lara Resende acha que a psicanálise foi, para ele, uma espécie de sucedâneo da literatura. Só recentemente, e ainda assim sem entusiasmo, Hélio concordou em trazer à tona seus baús literários. Ao morrer, preparava uma coletânea de artigos publicados na imprensa, A Burrice do Demônio, outra de textos sobre psicanálise e uma terceira de versos.Em tudo o que escreveu, poesia ou prosa, Hélio Pellegrino deixou a marca de uma inextirpável religiosidade, um cristianismo que ele, "socialista histórico, eventualmente histérico", casava bem com o marxismo. "Por mais que fizesse força, não conseguia escapar do projeto de Deus", diz Frei Betto. Hélio não brincava quando dizia que o programa do PT, para ser perfeito, só faltava incluir a ressurreição da carne — porque, explicava, "não há afirmativa mais materialista e mais revolucionária do que esta.
Duas semanas antes de morrer, num jantar em sua casa, ele surpreendeu alguns dos convidados ao pedir que Frei Betto lhe arranjasse um padre, pois queria se confessar. "Logo você, Hélio, adepto da Igreja moderna, da Teologia da Libertação?, houve quem se escandalizasse. Um dos presentes lhe perguntou se aquele desejo de se confessar não escondia o medo de morrer. "Não, com a morte eu já acertei as minhas contas", respondeu Hélio serenamente, para arrematar com bom humor: "Meu problema, agora, é com Deus — e, como mineiro, prefiro chegar a Ele através de um chefe de gabinete...
(*Humberto Werneck é editor de cultura da revista Isto É.)
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De Helio Pellegrino:
Sobre a tortura
"A utilização da tortura contra presos políticos, ou contra quem quer que seja
, constitui crime de lesa-humanidade, e nesta medida fere de morte o imenso esforço civilizatório pelo qual a raça humana, através dos tempos, busca salvar-se das trevas da barbárie (...) A tortura visa a produção diabólica de um discurso que é o avesso da liberdade. Ele vira o torturado pelo avesso, na busca de uma confissão que o destrói, envenena as fontes de sua vida carnal e de seus valores espirituais.
"A tortura — corrupção absoluta — serve ao mal e à morte. A dignidade da vida, também absoluta, exige que em nenhum momento nos esqueçamos da tortura, sua negação mais evidente.
Só a verdade liberta — diz a tradição humanística de todas as idades. Ao denunciar os torturadores, a sociedade civil busca não o revanchismo, mas a dignidade e a liberdade.
"A violência da tortura não é a violência da guerra. Esta, embora detestável, não chega a destruir o chão ético que torna possível a vida — e a morte — comunitária. Tortura é barbárie, pira e simples. (...) Na tortura o torturador desonra e destrói a condição humana e, portanto, foge da possibilidade social de anistia. Só se esquece um erro que pertença ao território humano. Um erro que destrói o fundamento da condição humana não pode não deve — ser anistiado, a não ser pela misericórdia de Deus.

Relato de uma conversa com Amílcar Lobo, em setembro de 1986:

"Por fim contou-me um episódio edificante. Tinha consultório no mesmo andar e no mesmo prédio que o Dr. Leão Cabernite, que havia sido seu analista-didata. Era o tempo da crise, e os libelos por mim escritos deveriam incomodar os burocratas da SPRJ. Um dia, encontrou o Dr. Cabernite no corredor. Começaram a conversar sobre a tempestade que sacudia a SPRJ, até que o Dr. Cabernite lhe perguntou: ‘O Lobo, você não tem algum amigo militar que possa dar una cana dura nesse Hélio Pellegrino? Esse sujeito é insuportável e anda precisando’.

Sobre a criminalidade no Brasil

"Criminalidade é efeito, é forma perversa de protesto, gerada por uma patologia social que a antecede e que é, também ela, perversa. (...) Uma crise social se torna apta a fomentar a criminalidade quando chega a lesar, por apodrecimento grave, os valores sociais capazes de promover a identificação agregadora entre os membros de uma comunidade."A crise brasileira, tal como agora a descrevemos, corresponde minuciosa e cuidadosamente ao tipo de crise capaz de produzir o sintoma da criminalidade. Assistimos, em nossa terra, provocada pelo capitalismo selvagem, uma guerra civil crônica, cuja assustadora violência nos enche de pasmo — e pânico. A criminalidade dos miseráveis, dos famintos, dos desesperados, dos revoltados, exprime uma forma perversa de protesto social, que não conduz a nada, e sem dúvida piora tudo. O delinqüente, ao cometer seu crime, não pretende nenhuma transformação da sociedade. Ao contrário, busca identificar-se imaginariamente com o seu inimigo de classe, copiando-lhe caricatamente os defeitos e deformidades.
"A direita, pelos tempos afora e nos mais variados quadrantes, é useira e vezeira em atribuir alguns de seus piores crimes aos adversários de esquerda, com objetivo de denegri-los — e persegui-los. Tenta-se armar, nesta medida, uma subversão monstruosa: a autoria e a responsabilidade do delito são transferidos, pelos delinqüentes, aos que a eles se opõem, de modo que os criminosos, botando banca de impolutos, ainda encontrem, de lambujem, razões e argumentos para desmoralizar, reprimir e, se possível, eliminar seus oponentes.(...) A guerrilha dos ricos, em nome da TFP (Tradição, Família e Propriedade) e, agora, da UDR (União Democrática Ruralista), assassinou em 1985 perto de 250 trabalhadores rurais e continua a fazê-lo. Para torpedear o Plano Cruzado, pecuaristas da mesma UDR tentaram, na Europa, pagar dez dólares por tonelada de carne não exportada para o Brasil, no sentido de forçar a alta do produto. Qual é, a respeito, a opinião do general Ivan Mendes, chefe do SNI? Nós, do PT, temos a nossa — e não a escondemos. Quem são os delinqüentes?

Sobre as diretas...

"Vão perder a guerra, sim. Mais precisamente: já perderam. O povo nas pragas assumiu, sem caminho de volta, seu protagonismo histórico. A ditadura, trespassada pelo próprio fracasso, estrebucha. Sua violência já não infunde medo ou respeito. O autoritarismo e o arbítrio não conseguem auto-sustentar-se por mais tempo. O anticomunismo, como ideologia ativa, está esgotado, inclusive nos meios militares. E a exigência de impunidade dos corruptos não é razão decente para deter a abertura, tanto mais que a imensa maioria das Forças Armadas não é corrupta. Portanto, diretas-já. É este o mínimo a que tem direito o povo brasileiro depois de tanta tormenta e tanto dano.

Sobre o governo Sarney

"...E é isto, exatamente, o que está fazendo o governo Sarney. Há uma conspiração, dentro de seus quadros, contra a reforma agrária. Querem transformá-la numa negociata sinistra, conspurcando uma bandeira manchada com o sangue de mártires, como o padre Josimo e milhares de líderes camponeses massacrados. (...) Hoje, a guerrilha dos ricos, patrocinada pela UDR e pela TFP, está impune e vitoriosa. O Estatuto da Terra, engendrado pelos próprios militares, foi jogado no lixo. O retrocesso vergonhoso nos aproxima da barbárie e do genocídio, pela violência e pela fome. ‘Estamos vivendo como nos piores tempos da ditadura’ — diz D. Ivo Lorscheider, presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). Tem razão.

Sobre a Igreja e o marxismo

"Não existe, para o ser humano, espiritualidade desencarnada. Se isto fosse possível, Deus salvaria o homem por decreto, e não mandaria seu filho ao mundo para ser, entre nós, uma plena — e esplêndida — prática divina. Cristo nasceu, viveu e morreu. Ele foi o verdadeiro homem e, na ação de sê-lo, através de sua prática humana, garimpou e resgatou a luz de Deus que há no coração de todos os homens. A luz de Deus, aliás, reside não apenas no coração dos homens, mas no coração da matéria. Nesta medida o materialismo não ofende a Deus, nem o renega — necessariamente. Marx, materialista e ateu, está mais próximo da verdade de Cristo do que, por exemplo, o senhor Paulo Salim Maluf, católico praticante e confesso, mas dado a práticas perfeitamente inconfessáveis.

Sobre o PT e as eleições

"O socialismo é hoje, no Brasil, um projeto possível, em virtude da existência do PT. Não é por outra razão que se procurou, recentemente, comprometer a todo pano a figura de Lula, distorcendo e deformando, a serviço da reação contrista ou direitista, as incisivas e corajosas declarações do presidente do PT feitas à Folha de S. Paulo. Lula sabe — como sabem os marxistas e os cristãos revolucionários — que a história do Brasil e, de resto, a história do mundo, é determinada pela luta de classes. Para que haja uma democracia que mereça o seu nome é preciso pugnar por uma 'sociedade sem classes' onde não haja uma minoria opressora e uma imensa maioria oprimida e explorada. Lula sabe também que, em nosso país, a classe dominante, para manter sua hegemonia, é capaz de qualquer vileza e de qualquer violência. As eleições burguesas só são toleradas — e seus resultados mantidos — na medida em que não ameaçam tal hegemonia. Transformá-las em fetiche é cair na perversão do processo democrático, cujo estuário só pode ser o controle da economia e do poder pela classe operária.

Sobre a psicanálise

"Quando Freud desembarcou na América, em 1909, para fazer uma série de conferências — hoje célebres — sobre psicanálise, virou-se para Jung, que o acompanhava, e disse: 'Venho trazer-lhes a peste'. Em verdade, e num certo sentido, a psicanálise é a peste; ou melhor, ela representa a antiutopia mais radical até hoje concebida pelo espírito humano, chegando mesmo a constituir-se como uma utopia às avessas. A psicanálise pretende curar o ser humano de suas ilusões. Ela não acredita na bondade fundamental do homem, nem parte do princípio de que o processo civilizatório é uma rampa ascendente, de sucessivas vitórias, que chegarão necessariamente à plenitude do amor de todos por todos. A luta entre Eros e Thanatos — vida e morte — se decide dentro de nós, a cada instante. Por nascermos prematurados, incompletos, sem equipamento instintivo capaz de nos costurar com solidez ao mundo, sofremos a permanente saudade de ser pedra, a nostalgia de um sono sem retomo, regido por estatuto que nos transcenda e que não possamos desobedecer ou transgredir."O ser humano é ruptura com a natureza e a ordem cósmica, salto para a cultura, a linguagem e a lei, por cujo intermédio tenta assumir o rombo de indeterminação e liberdade que constitui o seu centro. A psicanálise é a ciência desse salto e do processo pelo qual gradativamente, nos tornamos humanos, através de dolorosas lutas e renúncias.

Sobre a morte

"Nesse campo de paradoxos acelerados, podemos dizer que o suicida — e também o homicida — tem horror à morte e quer matá-la em si mesmo e no outro. Morrer é coisa de vivos — não de mortos. Morro enquanto vivo e, ao morrer, perco a vida e a morte, para entrar noutro reino. Luz e sombra, escuridão e rutilância dão-se sempre as mãos na eterna passagem das coisas, e no eterno retorno de tudo.


(Seleção de textos por Maria Rita Kehl e Patrícia Costa)--- ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Junto com o poema de Hélio Pellegrino, abaixo publicado, veio um bilhete em que Humberto Werneck revela: "... ele dizia que escrevê-lo foi sua primeira reação diante do golpe de 64".

A CÓLERA-ESPERANÇA

Atiro-a contra as quinas erguidas desta madrugada, contra estes edifícios enormes, parados contra o cinza do céu sujo como o sabão que lava o piso dos botequins ao fim da noite.


Atiro-a contra o cansaço do mundo, contra o meu próprio e inenarrável cansaço, atiro-a em nome da utopia que é minha, a tua, a nossa utopia, atiro-a com raiva, sem estratégia, sem prudência, como uma hemorragia que se esvai e tinge a calçada com o esguicho de seu incêndio rubro.


Atiro-a para nada, para o nenhum resultado do grito que precede o baque do corpo atropelado na rua, atiro-a no ar do mar, na curva corrosiva do azul, à porta dos orfanatos e prostíbulos, atiro-a ao chão, como bile sanguinolenta que escorre, como quem cospe um dente arrancado por um murro na boca.


Mas atiro-a, flecha turva, esperança e nojo, vida e cólera, atiro-a com este punho fechado, com esta sede e esta fome, atiro-a com a funda mais funda do meu sonho mais profundo, atiro-a contra argentários e fundiários, opressores e ditadores, atiro-a em meu nome e em nome dos que ainda não têm nome, e em nome dos que em dores e cólicas acordam para o seu nome, e ao rés do chão, em pleno pó, o desentranham.


Hélio Pellegrino, abril, 1964



LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA PLANETA

LUCIDEZ EMBRIAGADA (L!)
Em 2004, Hélio completaria 80 anos e a data é marcada por dois lançamentos: Arquivinho Hélio Pellegrino (Bem-Te-Vi) e Lucidez embriagada (Planeta), que trazem textos inéditos e outros publicados na imprensa que, até então, permaneciam nos acervos da Casa de Rui Barbosa (Ministério da Cultura, no Rio de Janeiro) - onde haviam sido depositados pelo psicanalista Pedro Pellegrino, filho de Hélio -, e de Otto Lara Resende no Instituto Moreira Salles, em São Paulo.
Assim como muitos leitores de sua idade, Antonia Pellegrino, 24 anos, desconhecia esse material. Em janeiro de 2003, decidiu pesquisar os acervos e passou cerca de um ano lendo e relendo o avô. A partir deste trabalho, organizou Lucidez embriagada.
- Em vários momentos, reconheci nas palavras dele coisas fundamentais da minha educação e que moldaram a minha personalidade, o meu jeito de pensar o mundo, de me colocar nele. Coisas que eu não sabia que tinham sido passadas de pai pra filho, e daí pra mim - conta Antonia, cujos gestos largos com as mãos enquanto fala não negam sua origem.
De acordo com Antonia, o critério de seleção dos textos foi pensado a partir dos temas mais recorrentes. A divisão insinua um encadeamento de questões primordiais para Hélio Pellegrino: o primeiro capítulo, Hélio, inclui uma entrevista concedida à escritora Clarice Lispector e um ensaio sobre si mesmo. Apesar de as três partes do livro contarem com bilhetes, cartas e poemas, esta é a mais autobiográfica. No segundo capítulo, Outro, artigos sobre Nelson Rodrigues, Mário de Andrade, Che Guevara e Alceu Amoroso Lima. Fala também de sua analista, Iracy Doyle, e de Lacan. Encontro é a terceira parte, em que Hélio discute política e joga sua eloqüência contra a ditadura; acabaria preso após o AI-5 como líder comunista, dividindo cela com o jornalista Zuenir Ventura, que assina a orelha do livro. Trata de psicanálise e das possibilidades do que considerava o principal trabalho do ''homem que merece seu nome'': o encontro com o outro.

CASTORIADIS, CORNELIUS


CORNELIUS CASTORIADIS



Foi um dos maiores expoentes da filosofia francesa do século XX. Autor de inúmeras obras de filosofia e, em especial, de filosofia política. Cornelius Castoriadis é considerado um filósofo da autonomia. Dedicou-se também à teoria psicanalítica. Foi no seio do marxismo que se formou Cornelius Castoriadis, um dos críticos mais ácidos das burocracias comunistas e um dos poucos pensadores de formação marxista que foi capaz de demonstrar de forma clara os limites que se colocavam contemporaneamente às teorias desenvolvidas por Karl Marx no século XIX. Nascido em Constantinopola, de família grega, em 1922, Castoriadis aderiu, durante a ocupação nazi da Grécia ao Partido Comunista, mas rapidamente afastou-se por divergências com a política do partido e principalmente com os métodos adotados para abafar todas as críticas e debates internos. Naquela época, tal como outros dissidentes do marxismo, aderiu ao trotskismo, idealizado como uma corrente marxista anti-burocrática e anti-estalinista. Nas suas palavras conseguiu sobreviver à dupla perseguição da Gestapo e do GPU local, ou seja à repressão nazi e estalinista, que assassinaram inúmeros militantes revolucionários na Grécia Viveu em França desde 1945. Co-fundador do grupo e da revista Socialisme ou Barbarie, foi seu animador desde o início até ao fim (1949-1965), tendo sido autor dos principais textos que lhe fixaram as ideias e a sua orientação. Dentre sua obra, destacam-se, para além de A Ascensão da Insignificância, L’Institution Imaginaire de la Société (1975), Capitalisme Moderne et Révolution (1979) e La Société Bureaucratique (1990). Cornelius Castoriadis morreu em Paris em Dezembro de 1997.


LIVROS ESCOLHIDOS



1) A INSTITUIÇÃO IMAGINÁRIA DA SOCIEDADE - ( L! )
EDIT. PAZ E TERRA

Autêntico produto da sólida reflexão de um dos pensadores atuais melhor instrumentado, esta obra não tem nada a ver com moda ou com qualquer espécie de misologia. Privilegiar a imaginação e o imaginário é propor, na perspectiva de Castoriadis, o despertar de um sono dogmático, o da ontologia "identitária" da qual nem o próprio Marx escaparia e para o qual o ser teria sempre o sentido de ser determinado. Privilegiando o determinado, o acabado, tal ontologia petrificaria a realidade histórico social, mascarando-a na sua dimensão de criação continuada.


2) AS ENCRUZILHADAS DO LABIRINTO - VOL. 1 ( L! ) -
EDIT. PAZ E TERRA


Os ensaios aqui reunidos tratam de temas aparentemente distantes: a psicanálise, a linguagem, a epistemologia das ciências, a técnica, a economia política. No entanto, uma mesma preocupação os une profundamente. Trata-se de destruir uma persistente pretensão à cientificidade, último mito das velhas opressões que permanece. Encruzilhadas do labirinto : não estamos totalmente perdidos e não encontramos nenhum minotauro que não deva sua força a nossos fantasmas.

3) AS ENCRUZILHADAS DO LABIRINTO – VOL.2 ( L! )
EDIT. PAZ E TERRA


Análise de conjuntura e da filosofia social. Neste conjunto de ensaios, Castoriadis expõe suas concepções políticas, analisa a evolução da União Soviética - antevendo com lucidez os impasses da Glasnost e da Perestroika - o conflito na comunidade internacional, a democracia e o conhecimento. É um livro essencial para todos aqueles que acreditam numa crítica sem limites da atualidade, sem perder a esperança na transformação.

4) AS ENCRUZILHADAS DO LABIRINTO – VOL.3 ( L! )
EDIT. PAZ E TERRA


Para Castoriadis o mundo está fragmentado, mas não cai aos pedaços: é portanto preciso refletir. Permeando este lúcido painel dos tempos atuais, encontram-se o questionamento da própria modernidade e a valorização da função crítica, sem limites, às instituições existentes. Aos que insistem na proclamação do fim da filosofia, Castoriadis lembra que o pensamento reflexivo e a democracia nasceram juntos, graças à atividade humana, e dela dependem para continuar a existir.

5) SUJEITO E VERDADE NO MUNDO SOCIAL-HISTÓRICO -
EDIT. CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA
(L!)

Reúne parte dos seminários do filósofo e pensador grego Cornelius Castoriadis, um dos maiores expoentes da filosofia francesa do século XX, na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS) no ano letivo de 1986-1987. Neles, Castoriadis examina duas questões que considera indissociáveis: qual a situação do sujeito hoje em dia? E em que medida existe criação social-histórica da verdade? SUJEITO E VERDADE NO MUNDO SOCIAL-HISTÓRICO é o testemunho de um pensamento original, primeiro volume daquele que seria o grande projeto do autor, mas que ele próprio não conseguiu finalizar.