CARPENTIER, ALEJO


ALEJO CARPENTIER

Romancista, contista, poeta e musicólogo, Alejo Carpentier nasceu em Havana em 1904. Filho de arquiteto francês, passou a infância na Europa. Em 1921, de volta a Havana, inicia estudos de Arquitetura, os quais abandona para dedicar-se ao jornalismo e à música. Em 1924, é nomeado chefe de redação da revista cubana Carteles, e começa a trabalhar como organizador dos primeiros concertos de "música nova".É preso em 1927 por participar de um protesto contra a ditadura de Machado. Abandona Cuba secretamente e muda-se para Paris, onde permanece até 1939. Durante sua estada em Paris, trabalha como crítico musical e como compositor; entra em contato com o grupo surrealista de A. Breton; e colabora com a revista Révolution Surrealiste.Em 1933, viaja a Madri, onde publica sua primeira novela. De volta a Cuba em 1939, alterna seu trabalho na rádio nacional com investigações musicológicas.Depois de um longo período na Venezuela (1945-1959), regressa a Cuba, onde desempenha diferentes funções políticas e docentes, tendo sido adido cultural em Paris.Em 1977, recebe o prêmio de literatura "Miguel de Cervantes". Um de seus mais interessantes aportes literários é o conceito do "real maravilhoso", desenvolvido no prólogo de seu romance El Reino de este Mundo. Este conceito é, sinteticamente, a coexistência em um mesmo espaço e tempo de dois mundos diferentes. Morre em Paris em 1980.


LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA MARTINS FONTES


PASSOS PERDIDOS

Ao fugir de uma vida árdua em Nova York, um musicólogo viaja para uma das raras regiões do mundo aonde a civilização não chegou – as altas extensões do rio Orinoco,tendo como missão a coleta de instrumentos musicais indígenas para uma das galerias de um museu organológico. À medida que ele penetra os labirintos da floresta, a viagem se revela também uma volta às etapas históricas mais significativas da América, ao tempo dos passos perdidos da humanidade: um lugar onde o progresso desvaneceu.
“Se, dentro dos cânones musicais, o jazz, a música popular e outros ritmos podem representar uma aproximação do homem com o próprio corpo e a natureza, fora deles restam ainda os ritmos primeiros, que mimetizam ou até são a natureza, quem sabe anteriores ainda à invenção da música como linguagem. E é dessa anterioridade que trata "Os Passos Perdidos". Neste romance, a arte como nós a conhecemos, formal e escrita, não mais redime, mas perde o homem civilizado, para sempre sentenciado à representação. Nele, um musicólogo de Nova York escapa para o rio Orinoco, atrás de uma suposta origem mimética dos instrumentos musicais. Embrenhado na floresta amazônica, descobre um tempo originário, onde a música não é atributo ou predicado de nada, ela somente é, assim como todo o resto.Fascinado pelo ser-em-si primitivo, o personagem não se dá conta de que a própria fascinação já é um afastamento e vai se perdendo, assim, de si mesmo e de tudo, condenado, como somos todos, à mordida irreversível da maçã. O que ocorre é que tudo isso é narrado de maneira tão arrebatadora que ficamos sem saber se preferimos a fonte original ou a civilização. Carpentier é prova de que o conhecimento também é capaz de nos reaproximar do incognoscível.”
(Noemi Jaffe, “Folha SP”, 19/10/2008)

ADORNO, THEODOR


THEODOR ADORNO

Adorno e a cultura de massa
Theodor Adorno, filósofo e sociólogo alemão, projetou-se como um dos críticos mais ácidos dos modernos meios de comunicação de massa. Ao exilar-se nos Estados Unidos, entre 1938 e 1946, percebeu que a mídia não se voltava apenas para suprir as horas de lazer ou dar informações aos seus ouvintes ou espectadores, mas fazia parte do que ele chamou de industria cultural. Um imenso maquinismo composto por milhares de aparelhos de transmissão e difusão que visava produzir e reproduzir um clima conformista e dócil na multidão passiva.
Theodor Adorno, nascido em Frankfurt, na Alemanha, em 1903, foi daqueles tantos intelectuais, cientistas, artistas, compositores e escritores alemães, que, na década de 1930, por serem de descendência judaica ou por inclinarem-se pelo socialismo, ou ambas as coisas, foram obrigados a emigrar para os Estados Unidos, naquilo que foi, talvez, a maior evasão de cérebros registrada na história contemporânea. Ele pertencia a um grupo de pensadores extremamente sofisticado que fazia parte da famosa Escola de Frankfurt, fundada em 1923, e que fora constrangido a sair do país nos anos seguintes da ascensão do nacional-socialismo ao poder.
É de se imaginar o contentamento dele quando, ainda na Suíça, no outono de 1938, recebeu um inesperado telefonema de Londres do seu particular amigo e parceiro, Max Horkheimer. Era um convite para que ele fosse à América para assumir uma pesquisa a serviço da Universidade de Princeton, a mesma que, em 1933, convidara Albert Einstein para integrar o seu corpo docente.
Tratava-se de um projeto e tanto, pois a Radio Research Projet queria saber tudo sobre os ouvintes norte-americanos. Nova Iorque provocou-lhe uma estranha reação. Chocou-o a convivência dos “palácios colossais...dos grandes cartéis internacionais”, com sombrios edifícios erguidos para os pequenos negócios, formando, no geral, um ar de cidade desolada. Nem mesmo o plano municipal de levar gente a morar nos subúrbios mais afastados, dando as residências um ar de individualidade, o consolou.


A estandartização americana
Para ele, um europeu refinado que passara boa parte da sua vida cultivando a música modernista de Alban Berg e, depois, a de Schönberg e sua atonalidade incidental, a América pareceu-lhe toda igual. Contraditoriamente, o país que mais celebrava e enaltecia a singularidade, a cada um procurar ser algo bem diferente dos demais, não parava de produzir e imprimir tudo idêntico, tudo estandartizado. A imensa rede de atividades que cobria toda a cidade era regida apenas pela ideologia do negócio. Numa sociedade onde as pessoas somente sorriam se ganhavam uma gorjeta, nada escapava das motivações do lucro e do interesse. Aprofundando-se no estudo da mídia norte-americana, entendeu que por detrás daquele aparente caos, onde rádios, filmes, revistas e jornais, atuavam de maneira livre e independente, havia uma espécie de monopólio ideológico cujo objetivo era a domesticação das massas. Quando o cidadão saía do seu serviço e chegava em casa , a mídia não o deixava em paz, bombardeando-o, a ele e à família, com programas de baixo nível, intercalados com anúncios carregados de clichês conformistas, comprometendo-o com a produção e o consumo.
Não se tratava, para ele, de que aqueles sem fim de novelas e shows de auditórios refletissem a vontade das massas, algo autêntico e espontâneo, vindo do meio do povo. Um anseio que os profissionais da mídia apenas procuravam dar corpo, transformando-os diversão e entretenimento. Ao contrário, demonstrava, isso sim, a existência de uma poderosa e influente indústria cultural que, de forma planejada, impingia aos seus consumidores doses cavalares de lugares comuns e banalidades, cujo objetivo era ajudar a reproduzir “o modelo do gigantesco mecanismo econômico” que pressionava sem parar a sociedade como um todo.
Lá, na América, não havia espaço neutro. Não ocorria uma cisão entre a produção e o lazer. Tudo era a mesma coisa, tudo girava em função do grande sistema. Dessa forma, qualquer coisa que causasse reflexão, uma inquietação mais profunda, era imediatamente expelida pela industria cultural como indigesta ou impertinente. Adorno, terminada a Segunda Guerra, voltou para a Europa, para Frankfurt, atarefado em reabrir a sua escola de sociologia. Morreu em 1969, arrasado com a humilhação que estudantes ultra-esquerdistas o submeteram, em plena sala de aula, durante a revolta de 1968/9.


Obras principais de Adorno

1933 - Kierkegaard. Konstruktion des Ästhetischen (Kierkegaard, a construção da estética)

1947 - Dialektik der Aufklärung. Philosophische Fragmente (A dialética do esclarecimento. Filosofia em fragmento), com Max Horkheimer)

1949 - Philosophie der neuen Musik (A filosofia da nova música)

1950 - The Authoritarian Personality (A personalidade autoritária) juntamente com E. Frenkel-Brunswik, D. J. Levinson e R. N. Sanford)

1951 - Minima Moralia. (Mínima morália)

1956 - Zur Metakritik der Erkenntnistheorie. (Sobre a metacrítica da teoria do conhecimento)

1967 - Negative Dialektik (Dialética negativa)

1970 - Ästhetische Theorie (Teoria estética)

1971 - Soziologische Schriften (Escritos sociológicos)


LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA DA UNESP

AS ESTRELAS DESCEM À TERRA: A COLUNA DE ASTROLOGIA DO LOS ANGELES TIMES

As Estrelas Descem à Terra é um texto sui generis no conjunto da obra de Theodor W. Adorno: por um lado, tem uma conexão direta com o núcleo duro do pensamento do filósofo, já que aborda temas como a interpenetração entre o racional e o irracional, o processo de dominação característico do capitalismo tardio, a cultura de massas etc. Por outro, trata-se de uma obra em que as idéias propriamente filosóficas de Adorno não ressaltam tão claramente como em outros de seus livros mais conhecidos. No que concerne ao background filosófico de As estrelas descem à Terra, a vinculação mais evidente é mesmo com a Dialética do Esclarecimento, obra em que Horkheimer e Adorno apontam para o fato de que o esclarecimento, longe de se limitar a um movimento intelectual europeu do século XVIII, o Iluminismo,tem suas raízes muito mais profundas na civilização ocidental, remontando à astúcia de Ulisses na epopéia homérica, no sentido de se valer de todos os meios que lhe eram disponíveis para alcançar o fim de retornar à ilha de Ítaca, onde, na qualidade de rei, era senhor de terras e rebanhos. Com isso querem os autores dizer que, adjacente a todo modelo de racionalidade que erige em fim último não a felicidade, mas objetos que, na verdade, seriam apenas meios de autoconservação da vida humana, reside uma indelével sombra da mais crassa irracionalidade.

LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA DA UNESP

INTRODUÇÃO À SOCIOLOGIA
Um dos grandes pensadores europeus de sua época se apresenta, neste livro, em uma atividade que poucos dos seus pares aceitariam. Em fase avançada da carreira, amplamente reconhecido, Adorno não hesita em ministrar curso introdutório à Sociologia para um público numeroso e sem preparo prévio. Logo em seguida, a expressão "fase avançada" serviria também para caracterizar sua vida, embora ninguém pudesse prevê-lo naquele momento de 1968, quando tinha 65 anos de idade. Morreria no ano seguinte, de enfarte, acossado por todos os lados - não só pela direita conservadora, como era de hábito - e após amargos embates com os militantes dos movimentos estudantis, que resultaram no cancelamento do curso de Sociologia preparado para 1969. Em uma das últimas aulas do curso de 1968 ele presta emocionada homenagem a colega recém-falecido, na qual enfatiza a tristeza, o desalento e as dúvidas do amigo sobre o acerto do retorno à Alemanha após a emigração, para comentar que ele próprio havia compartilhado esses sentimentos. Impossível não enxergar nessas palavras algo de premonitório.