PAULO EDUARDO ARANTES
Possui graduação em Filosofia pela Universidade de São Paulo (1967) e doutorado em Doctorat de Troisième Cycle - Université de Paris X, Nanterre (1971). Foi editor da revista Discurso (1976-1991). É professor aposentado do Departamento de Filosofia da FFLCH da USP e professor aposentado da Universidade de São Paulo. Foi Diretor da pós-graduação (1984-1998). Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em História da Filosofia e Filosofia política, atuando principalmente nos seguintes temas: globalização, Hegel, dialética, cultura brasileira, filosofia brasileira, relações políticas internacionais.
Possui graduação em Filosofia pela Universidade de São Paulo (1967) e doutorado em Doctorat de Troisième Cycle - Université de Paris X, Nanterre (1971). Foi editor da revista Discurso (1976-1991). É professor aposentado do Departamento de Filosofia da FFLCH da USP e professor aposentado da Universidade de São Paulo. Foi Diretor da pós-graduação (1984-1998). Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em História da Filosofia e Filosofia política, atuando principalmente nos seguintes temas: globalização, Hegel, dialética, cultura brasileira, filosofia brasileira, relações políticas internacionais.
LIVRO ESCOLHIDO - EDITORA BOITEMPO
EXTINÇÃO
A nova coleção de ensaios do filósofo aulo Arantes tem o título sombrio de Extinção: nada de muito surpreendente para osjá afeitos ao pensamento rigoroso, à erudição assombrosa e à verve satírica desse intelectual desabusado, formado na melhor tradição do Departamento francês de ultramar (título de outro livro do autor, no qual Arantes faz um acerto de contas com a história da formação do Departamento de Filosofia da USP).
Especialista em Hegel e auto-intitulado ‘um frankfurtiano de esquerda” (classificação já provocadora em si, pois implica a idéia de que existem, claro, “frankfhrtianos de direiti’), Arantes desfila sua veia irônica devastadora por algumas das questões mais fundamentais do cenário político e da cultura contemporânea — destacaria, aqui, a fina análise do documentário acerca do ex—secretário de defesa americano, Robert McNamara, e o agudíssimo ensaio sobre a onda de ataques do PCC a São Paulo.
A mera recensão do rol de temas enfrentados pelo filósofo nos dá o tom de seu fôlego, que se concentra tanto na problemática conjuntura da política internacional quanto nos descaminhos experimentados pela esquerda brasileira, seja em sua atividade teórica enquanto inteiigentsia marxista ou na efetiva participação política. Esse é um tema particularmente caro a Paulo Arantes, que poderia ser resumido na seguinte questão: qual o papel do intelectual marxista nos dias de hoje? Quais suas possibilidades de ação no interior da academia e da sociedade?
Se há algo de que Paulo Arantes não pode ser acusado (e as acusações realmente proliferam, o que é mesmo de esperar em alguém que ainda mantenha uma atitude crítica e combativa face às catástrofes da modernidade) é de conluio com o que se notabilizou na expressão “silêncio dos intelectuais”: ao lado do sociólogo Chico de Oliveira e alguns outros poucos, pouquíssimos, pensadores de nossa inteligência de esquerda, Arantes jamais poupou críticas aos companheiros do PT e ao governo Lula, muito antes que os escândalos que assolaram recentemente a nação viessem a público. Ao comentar o governo Lula, Arantes, em uma de suas tiradas típicas, dispara que “dizer que acabou não deixa de ser um exagero piedoso, pois supõe que em algum momento ele tenha começado”, o que já demonstra em elevado grau o compromisso de Arantes com a crítica mais ferrenha, não a troco do fogo de artificio ou do deslumbramento acadêmico, mas na direção de um enfrentamento permanente com a realidade, um detalhe básico que muitos de nossos intelectuais marxistas acabaram por esquecer, na passagem do bonde da história.
O volume da Boitempo integra a coleção Estado de Saio (justamente editada sob a batuta de Paulo Arantes), e o título não tem nada de casual: trata- se de um conceito fundamental para a compreensão da reflexão de Arames acerca da história contemporânea, que teve sua origem nos debates, ainda na República de Weimar, entre o fflósofo frankftartiano Walter Benjamin e o jurista CarI Schmitt, e encontraria posteriormente ecos no pensamento de Giorgio Agamben e nos livros de Toni Negri e Hardt.
No primeiro texto do livro, intitulado “Notícias de uma guerra cosmopolita”, Arantes faz uma análise amiudada da crise internacional representada pelos conflitos em curso, notadamente sobre a invasão americana ao Iraque. O título do artigo já direciona uma primeira estocada, ao relembrar, em chave sarcástica, a idéia kantiana de uma paz perpétua num mundo cosmopolita, algo que encontra guarida, para ficarmos apenas num autor mais célebre, no pensamento de Jürgen Habermas. Que a tal paz perpétua não se realizou é bastante evidente, O que não é evidente, e é justamente o ponto discutido por Arantes, é que, muito ao contrário, vivemos num estado de guerra permanente, ou seja, a nação imperial que domina hegemonicarnente o planeta, os Estados Unidos da América, que precisamente se confirmaram como império a partir da Segunda Guerra Mundial, permaneceu, desde sempre, em alguma espécie de conflito armado. O mais grave, segundo a lógica da argumentação desenvolvida por Arantes, é que esse estado permanente de beligerância é constitutivo do tão celebrado — pelos defensores do capitalismo de plantão — processo de globalização do sistema reprodutor de mercadorias.
Ora, como a América se encontra em estado de guerra permanente, o que foi especialmente agravado pela atual política de segurança do governo Bush, isso dá margem a um mecanismo jurídico perverso, ou seja: uma vez que estamos em guerr a, portanto, em uma situação extraordinária, podemos decretar o estado de exceção, ou estado de sítio, com a subseqüente abolição (ou restrição) das garantias individuais de liberdade, o descumprimento deslavado dos acordos de direito internacionais (como quando os EUA simplesmente deram uma solene banana para o Conselho de Segurança da ONU) etc. Repassando: uma vez que o que seria um estado extraordinário (o de guerra) se tomou a situação permanente, as medidas de exceção também aplicáveis num estado excepcional acabam por se tornar corriqueiras. Que esse caminho leva a um recrudescimento das piores políticas conservadoras, tingido até de tons fascistas, não é difícil de perceber.
Nesse livro instigante e vigoroso, Arantes nos desvela um mundo horrendo, em que a sanha destrutiva do capital leva de roldão, em ímpeto frenético, as ilusões e esperanças (quando não as vidas) da imensa maioria da humanidade. Mundo do lobby, das relações indecentes entre a política (se é que a expressão ainda faz sentido) e os interesses pessoais mais cínicos, em que a prática do esbulho desavergonhado, tão nossa conhecida, condena gerações inteiras à ignorância e à miséria.
Seguindo a máxima de Brecht, Arantes não parte das coisas antigas e boas, mas das novas e ruins, e Extinção não parece permitir ilusões de um futuro róseo. Mas se tudo que nos resta é a capacidade crítica de resistência, esta é exercida, com coragem e inteligência incomparáveis, pelo pensamento de Paulo Arantes .
(Resenha de Carlos Eduardo Ortolan)
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